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A mostrar mensagens de junho, 2024

Fragmentos

  O Imenso Comércio do Nada XXIII Cultura? Estar entre * Usamos o substantivo feminino cultura a partir da nossa concepção: estar entre. Estar entre prestar culto a um ou diversos cultos. Cingimos cultura a quaisquer objectos artísticos; não omitindo a sua inseparabilidade dos distintivos de classe e ratificando a impossibilidade de abstrair artistas e obras musicais mais do que do lugar de onde provêm das emoções estéticas e sociais que experimentam e provocam.  Imaginem a cultura enquanto um curso de água natural: heterogéneo, indiferenciado. Esse curso está entre. Durante o percurso acolhe trajectos de rios, ribeiros, lagos, poças; a jusante parte de uma tabulação dos valores das diversidade e diversão, do entretenimento; todos mergulham no curso como fuga ao tédio, ao hermetismo, a certas manifestações da vontade. Ao acompanharmos este movimento aparentemente natural, vemos como esse curso de água desagua, irremediavelmente, num lugar prenhe de líquidos convertidos, apesar de se tr

Fragmentos

  Amélia Muge com Samora Machel, 1975, Maputo fotografia de António Quadros O passado por pouco que nele pensemos é coisa infinitamente mais estável que o presente … Marguerite Yourcenar   Arrastando tempestades Que nos fustigam as carnes Desfazendo com uivados O que foi a nossa imagem Resto de nós, quase aragem… Amélia Muge Mas, eu assim o quis! F. Nietzsche Breve resumo      Amélia Muge (n.1952) é uma artista polifacetada. Intérprete, compositora, autora-poeta, ilustradora. É também historiadora de formação, e talvez isto explique algumas das suas opções estéticas como se verá. Sujeito de um contexto social e de um universo artístico especiais (como o são todos, dirão, e tendemos a concordar) marcados por descontinuidades e cisões com modelos de produção discursiva e de recepção precedentes. Imprime, numa primeira fase, uma linguagem nitidamente engajada ideologicamente e, numa fase sucedânea, dinâmicas entre palavras trazendo para a sua criação símbolos da ancestr

Fragmentos

  O Imenso Comércio do Nada XXII A dádiva de uma arte musical revoltosa é um salto do escuro [...] A dádiva da vida é um tiro no escuro, é o apelo da selva É a grande roda, a grande viagem. E se a enganamos, cuidado. Vem logo aí a garra do macaco. É melhor parar. Olha em volta. Escuta. [...] Amélia Muge e Laurie Anderson (‘A Garra do Macaco’ no disco A Monte , tradução de João Lisboa) [...] Há nas formas da palavra humana uma desconhecida operação de rapina, uma autofagia rapace em que o poeta, preso ao objecto, se vê devorado por ele [...] Antonin Artaud ( Revolta Contra a Poesia no Caderno AH! #13, tradução de Fernando Ramalho) Ao estar na periferia do campo de poder político; por ser quase inexistente, silenciada ou subtraída nele, a mulher musical tem uma forma de reconstruir pedaços da narração memorialística e de tomar posição. Um cotejo rememoriável. Repensando cenários culturais determinados por conjunturas históricas e políticas hostis ou dúbias, abre espaço a outras maneiras