Avançar para o conteúdo principal

Fragmentos

Conversas anartísticas e profundamente comprometidas com os estados dos espíritos ou Um espaço de crítica livre sobre os infortúnios da história cultural e das artes com Elagabal Aurelius Keiser e Soraia Simões de Andrade Para ouvir, subscrever uma destas plataformas: Soundcloud, Spotify, ou Apple.
Gravado no início da semana, este episódio poderia começar assim: certas pessoas ilustradas falam abertamente do que pode levá-las a ser profundamente críticas no seu quotidiano e em todos os seus actos, mais e menos vistos, de todas aquelas criaturas num roda-roda-constante em torno do centro do umbigo, e que, ao longo da história, têm dado a mão ao palratório sobre si em torno de si. Tomámos como ponto de partida o livro Shoot the Women First, traduzido e editado entre nós em 1998 pela extinta Fenda, livro que parte da compilação de várias entrevistas de Eileen MacDonald a mulheres de organizações armadas em lugares como Síria, Palestina, Irlanda, País Basco, Itália, Alemanha... No domínio da rebelião e da crítica do mundo envolvente os homens brancos burgueses não têm a exclusividade da violência. Embora só a segunda das estirpes humanas ocupe os escaparates analógicos e digitais envolta de um certo prestígio e justicialismo. Invariavelmente. Vistas como intrusas num universo másculo, destruindo a ideia de fraqueza física arreigada no mundo bélico, em defesa das convicções mais profundas, sejam de natureza dita política, ou dita cultural, elas, as outras, as que raramente interessa que apareçam nas contagens e figurações, também são capazes de matar. E se Luigi Mangione fosse qualquer uma destas retratadas no livro de MacDonald? Se fosse pobre e imigrante? Toda a crítica mediática é feita do lugar do falo consternado. É, de facto, um gigantesco edifício discursivo, cheio de gambiarras natalinas, de métodos contra métodos, um academicismo contra academicista, ambos prenhes de glosas já ripadas, já pensadas, já riscadas; porém, murcho das experiências convocadas, reiterando repetidamente a lógica das coisas por via do mundo dos bens garantidos para sua subsistência e afirmação de uma superioridade.

Comentários

Mensagens populares deste blogue

Fragmentos

  O Imenso Comércio do Nada XXI Interessa mais mostrar ao que se vem que zombar ministrando quem já lá estava Vivemos numa altura de rebaixamento de todo o gestuário possuído de frenesim filantropo. Não muito distante de outras fases convulsivas da história; possivelmente muitas pessoas gostam de acreditar que estão a viver o seu próprio poema épico. Vejamos, estão na sua senzala imaginária erguida no interior de baldios ou assumidamente na casa-grande (não é aqui que está o demi-monde? Será o pàrvenú?) suprimem à história o que ela é: realidade, conquista, guerra, conflito, limpam do logradouro duas sublimações espetadas à entrada, Cuidado com a Cadela! e o fraseado do  historiador britânico Eric Hobsbawn, qualquer coisa como: ‘o historiador é aquele que relembra à sociedade aquilo que ela procura esquecer’. Em alturas de insurgência artística, por exemplo, os incendiários parecem estar todos na casa-grande, varre-se dos pinhais a memória e começam a assenhorar-se do terreno...

Fragmentos

O Imenso Comércio do Nada XX   É preciso esquecer para que tudo volte como novo Há momentos em que apetece deitar fora todos os fonogramas recentes com extensas durações de notas musicais para fazer o que uma só faria, ou, meramente, não deixar vir, eliminar antes que se entranhem, como apaguei há duas décadas o açúcar branco e a carne.  Por vezes parecem tentativas preocupadas apenas em manter os becos sem saída de outros, uma obstinação do tradicionalismo; uma tradição que se gozou de vanguardismo foi por não ter pretensões e não almejar ser canonizada. Uma tradição cuja face mais visível até podemos transferir para o presente sem nenhuma demanda extraordinária estilando-a por aí e cantando ao céu, ao sol, à chuva, ‘aqui estou eu fora do resto’. Camaradas, não estamos fora do resto se tudo hoje forem restos de restos de outros momentos e de outros gestos.  Quem passou por um conservatório fora da capital, nos anos oitenta e noventa do século passado, viu-o suspenso no ...

Fragmentos

O imenso comércio do nada XXVI Talvez nos pareça ainda que uma das mais potentes formas de contracultura a partir dos anos dois mil seja o uso da internet. Sítio de poucas cedências ou barreiras, goza de similitudes com as demandas utópicas e libertárias da geração de sessenta; a mesma aura dos espíritos contestatários e livres de divisões classistas, porém, e mais cedo do que eventualmente previra, como sucedera a outras derivas antes do virtual, também essa ideia foi capturada por uma cultura reformatória e conformista. O interesse crescente por discos e livros de um período da história ou de outras latitudes geográficas traduzirá certamente o apreço por assuntos como os da coacção da censura e resistência ao salazarismo ou outras ditaduras, as críticas a uma ortodoxia neo-hiper-realista, os imperativos arquivísticos e éticos da literatura e da música proibidas e, de modo um pouco mais subtil, o sujeito poético em comunhão com a mimesis quotidiana , a recriação imaginária a partir...